Qua, 08 de junho de 2016, 09:50

Dromocracia Cibercultural: Saturação Tecnológica na Sociedade Contemporânea
Henrique Nou Schneider

Neste espaço, discuto o fenômeno da Dromocracia Cibercultural, apresentando seu conceito, suas características e os efeitos sobre a Sociedade, à luz do livro “A Dromocracia Cibercultural” e do artigo “Estética e Cibercultura: Arte no Contexto da Segregação Dromocrática Avançada”, ambos de Eugênio Trivinho.

Dromocracia Cibercultural é o fenômeno que define o estado atual da sociedade, no que concerne a sua relação de uso excessivo e decorrente dependência das tecnologias digitais. Podemos pensá-la como um circuito (fechado), no qual, internamente, existe uma retroalimentação decorrente de um círculo virtuoso efêmero, ou seja, cada interação do círculo, o retroalimenta, cada vez mais rapidamente, com níveis mais sofisticados de tecnologia.

Etimologicamente, o termo Dromocracia se origina do prefixo grego dromos, que significa rapidez, agilidade; emprestando ao conceito a idéia de uma “dinâmica societária subordinada ao imperativo da velocidade”, abrangendo, assim, “as profundas mudanças por que a vida humana tem passado nas últimas décadas, em função da aceleração tecnológica levado a cabo em todos os setores (esfera da produtividade, mercado de trabalho e de consumo, comunicação, urbanização, modelos e modismos, relacionamentos e assim por diante)”. Portanto, trata-se de um conceito antropológico e sóciotranspolítico efêmero que surge por conta do estado de saturação infotecnológica.

A Cibercultura refere-se, portanto, a uma cultura de ultravalorização das tecnologias informáticas, acelerada pelo comportamento dromocrático, o que produz o círculo tecnológico incremental e vicioso, por isso efêmero. Assim, a Dromocracia Cibercultural é caracterizada pelo uso saturado, pela sociedade, de materiais e suportes infotecnológicos digitais. A Dromocracia Cibercultural também é transpolítica, no sentido que “a maioria dos processos e fenômenos que nela nascem, se desenvolvem e desaparecem não perpassam mais o território das instituições convencionais da política herdada, tampouco são por elas administráveis ou controláveis”.

Segundo Trivinho, o fenômeno da Dromocracia Cibercultural gera violência sobre as pessoas, seja pela exclusão tecnológica ou pelo terror provocado naqueles que, perdidos na lógica dromocrática da Cibercultura, não conseguem manter-se no último nível de atualização tecnológica. Ele apresenta as senhas infotécnicas necessárias à inclusão digital: acesso à rede internet com qualidade, isto é, hardware atual, conexão com largura de banda adequada e o conjunto de software necessário; capital cognitivo para operar a tecnologia atual e acompanhar o seu desenvolvimento; e capital financeiro para manter-se tecnologicamente atualizado. Aqueles que possuem as senhas infotécnicas citadas são chamados de dromoaptos; os que não as possuem são considerados os dromoinaptos. Assim, a Dromocracia Cibercultural demanda, nas pessoas, o imperativo de ser veloz através da coação tecnológica. Portanto, a meta de inclusão digital é um mito, pois é impossível manter-se credenciado nos itens das senhas infotécnicas, na lógica imposta pela Dromocracia Cibercultural. Trivinho assevera: “Se o modus operandi da dromocracia sempre foi a ordem da violência e se as tintas desse pertencimento, agora fincado nos vetores da cibercultura, constam acentuadas, a própria dromoaptidão – e não já a dromoinaptidão socialmente produzida – encerra, por conseguinte, a violência em bloco desse mundo, legitimada e irradiada especialmente pelos ventos normativos da esfera da produção. Um ser veloz, em cujo corpo a dromoaptidão se incrustou como habitus, representa, em estado avançado, como figura psíquica típica da época, a introjeção dessa nova modalidade de violência”.

No outro lado dos excluídos digitais vigora a dromoinaptidão, causada pelo “neodarwinismo sociodromocratrático da cibercultura”, conforme Trivinho. De acordo com o Professor, “a ausência da posse plena ao capital de acesso (ao objeto infotecnológico, à rede e ao capital cognitivo conforme) equivale, no todo ou em parte, à angariação, dia menos dia, de uma pena capital, decreto de desterro no local: morte abstrata, mas efetiva, por denegação pantópica por parte do contexto, por fabricação social de impotência para os acessos requeridos; morte por dromoinaptidão socialmente induzida – eliminação simbólica sumária por miséria propriamente informática”.

Podemos questionar se não estamos diante de uma contradição ou mesmo de um paradoxo, pois a tecnologia deveria estar disponível para ajudar as pessoas, melhorando a qualidade de vida das mesmas. Trivinho afirma que “não se trata, absolutamente, de contradição ou paradoxo de época, mas da própria coerência interna desta: violência sofisticada do imaginário tecnológico instituído”.

O canal de expressão histórico que se pode esperar uma atitude de confrontamento e denúncia a essa espécie de violência aqui discutida, é a Arte. Porém, esta própria já foi cooptada e celebra os valores da Dromocracia Cibercultural, por meio do ciberufanismo estético que são apresentados nos diversos meios de expressão artística. Assim, como possível náufrago sobrevivente, a Arte deveria transpolitizar o real, servindo como veículo de crítica e politização à Dromocracia Cibercultural; todavia, devidamente desaparelhada da Cibercultura.

Henrique Nou Schneider é professor do Departamento de Computação (Dcomp)


Atualizado em: Qui, 18 de agosto de 2016, 14:52
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