Qui, 12 de julho de 2018, 19:16

Em primeiro seminário, Mestrado discute culturas populares
Evento também apresentou suas pesquisas à comunidade

A importância das culturas populares para a ciência tem sido cada vez mais defendida por pesquisadores. A Universidade Federal de Sergipe (UFS) abriga o primeiro mestrado do país sobre o tema, no Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Culturas Populares, o PPGCult, que realizou nesta quarta-feira, 11, seu primeiro Seminário.

Segundo a coordenadora do mestrado, Neila Maciel, a ideia do seminário surgiu para debater as pesquisas que estão sendo desenvolvidas pelos alunos, trazendo contribuições de outros pesquisadores para ajustes nos projetos. “Ao mesmo tempo, apresentamos à comunidade o que está sendo desenvolvido, para que outras pessoas que tenham interesse no programa possam conhecer as possibilidades, os temas que estão sendo abordados”, explica.

Em cada turno, as apresentações dos mestrandos foram precedidas por palestras de pesquisadores de áreas diversas. Neila esclarece que os dois palestrantes foram convidados visando às contribuições para as pesquisas dos alunos e ao debate sobre o tema.


Neila Maciel é professora e coordenadora do PPGCult
Neila Maciel é professora e coordenadora do PPGCult

O professor Érico José Souza de Oliveira abriu o Seminário. Ele é professor do Departamento de Técnicas do Espetáculo, da Universidade Federal da Bahia (UFBA), e discutiu os aportes teóricos, conceituais e epistemológicos sobre as culturas. O pesquisador defende que seja repensada a forma acadêmica de tratar a cultura. “Não como um lugar exótico, mas como um lugar que tem um cabedal conceitual tão importante quanto a própria universidade”, diz.

“Essa visão que a gente tem, de forma geral, sobre a cultura popular como algo menor é uma coisa construída: construída intelectualmente, como uma busca de dominação mesmo”, alerta Érico. Ele acredita que essa visão é influenciada por intervenções na formação dos países, a partir da Europa, que acabaram definindo as epistemologias a serem seguidas – epistemologia é a noção do que é considerado conhecimento válido.

Boaventura de Sousa Santos, quando trata das epistemologias do sul, faz essa diferenciação: o norte cria todo um arcabouço teórico para justificar uma dominação sobre as epistemologias do sul, como se fossem menores, como se fossem menos importantes do que o pensamento conceitual deles. Isso tem séculos e tem um resultado bem nocivo na sociedade, em todas as áreas, não só na universidade”, argumenta.


Érico José, professor da Universidade Federal da Bahia
Érico José, professor da Universidade Federal da Bahia

Essa posição leva Érico a defender o modelo do PPGCult. “Esse programa é de uma importância enorme para o Brasil, pela abordagem que ele dá – diretiva em torno das culturas, da cultura popular. É o primeiro do Brasil sobre isso”, pontua.

“Acredito – e espero – que em pouco tempo se tornará uma referência nacional, para entendermos que as culturas do Brasil são tão profundas e tão capazes de criar uma epistemologia própria quanto todas essas ciências construídas com esse pensamento eurocêntrico”, conclui.

Abrindo a tarde do Seminário, Roberto dos Santos Lacerda trouxe sua experiência com comunidades tradicionais. Ele é professor do Departamento de Educação em Saúde, do campus de Lagarto da UFS.

“Vim contribuir com as discussões sobre as práticas populares da saúde: como a saúde estabelece uma relação com a cultura”, define.

“Essa contribuição vem da minha trajetória e experiência, trabalhando com comunidades tradicionais, comunidades quilombolas, tanto na Bahia como aqui em Sergipe”, explica. Roberto tem doutorado em Desenvolvimento e Meio Ambiente, onde ele estudou a contribuição das práticas tradicionais de saúde para a conservação ambiental em comunidades quilombolas.


Roberto Lacerda, professor do PPGCult
Roberto Lacerda, professor do PPGCult

O docente, que ingressou recentemente no PPGCult, também levou ao Seminário discussões conceituais, de como a vivência com comunidades tradicionais lhe trouxe outros olhares para qualificar sua prática como pesquisador na academia: “na relação entre o popular e o científico, mas trazendo a contribuição do popular para o científico”, reforça.

Pesquisas

Sete estudantes do Mestrado em Culturas Populares apresentaram o andamento de suas pesquisas. Uma delas é Jéssika Silva Alves, cujo trabalho tem o título “Um olhar etnográfico sobre a festa religiosa de Palmeira dos Índios na construção do território e identidade”.

A discente é formada em Geografia e queria pesquisar as festas religiosas de sua cidade, com uma abordagem geográfica. “O PPGCult, por ser interdisciplinar, me possibilitou essa discussão, esse diálogo entre a geografia, a geografia cultural e os estudos culturais”, assinala.

Jéssika conta que sua cidade, no agreste alagoano, tem uma movimentação econômica muito grande por conta das festas religiosas, o que a levou a querer aliar a cultura à geografia. “[O objetivo] é pensar esses agentes políticos culturais, a questão do turismo religioso em Alagoas. Meu projeto fala sobre identidade, memória e as transformações e usos do território no município de Palmeiras dos Índios”, frisa.


Jéssika Alves, aluna do Mestrado em Culturas Populares
Jéssika Alves, aluna do Mestrado em Culturas Populares

O Programa

O PPGCult foi aprovado pelo Ministério da Educação em 2017, com duas linhas de pesquisa: “Artes populares: processos analíticos, pedagógicos e criativos”; e “Culturas populares: política, memória e identidades”.

Com sua primeira turma de mestrado em andamento, o programa é interdisciplinar, agrupando diversidade de olhares e perspectivas, para estabelecer reflexões mais abrangentes sobre o campo das práticas culturais populares.

“A proposta é discutir e ampliar as noções de cultura popular, ainda muito baseadas em uma visão folclorista, uma visão paternalista”, expõe a coordenadora Neila Maciel.

Uma das pesquisadoras que ajudou a criar o PPGCult, Alexandra Dumas, que atualmente é docente da UFBA, reforça a importância da interdisciplinaridade do programa.


I Seminário 'Culturas Populares em Debate'
I Seminário 'Culturas Populares em Debate'

“Percebemos que várias manifestações dessa ordem do popular não têm a escrita como sua prioridade de produção e manutenção de conhecimento, então refletir, conhecer, reconhecer essas práticas foi esse elemento motivador de encontrar um lugar de observação, de análise de sua importância e de sua complexidade”, disserta Alexandra, que continua como professora-colaboradora do programa.

O Mestrado em Culturas Populares abrirá edital de seleção no segundo semestre de 2018, para ingresso em 2019. Os interessados devem acompanhar a página do programa, clicando aqui. Quem quiser seguir as atividades do PPGCult nas redes sociais pode também acompanhar seu perfil no Facebook (clique aqui).

Ascom
comunica@ufs.br


Atualizado em: Qui, 12 de julho de 2018, 19:26