Josué Modesto dos Passos Subrinho
12/03/2010
Este formato folhetinesco é absolutamente incompatível com o estilo dos artigos, visto que não há qualquer suspense a prender a respiração e chamar a atenção do leitor. O artigo foi cortado pela incapacidade de síntese do autor e pelo bom senso dos editores em impor limites a extensão dos artigos, afinal, os leitores não podem ser amolados pela verborragia de escrevinhadores.
Se alguém teve a benevolência de ler os artigos anteriores e o requinte de não cumprir a obrigação de imediatamente providenciar a reciclagem do jornal onde eles foram impressos, me perdoe, mas preciso recapitular, ao menos, o tema que estamos tratando para informação do leitor comum.
Os artigos anteriores trataram da recorrente aparição de propostas de criação de uma universidade estadual, em Sergipe. Nosso estado é um dos três da federação que não dispõem de uma única instituição estadual de ensino superior, além de apresentar participação da população local matriculada em cursos presenciais de graduação menor que a participação da população sergipana, na população brasileira. Da mesma forma, a participação do PIB sergipano na economia brasileira é inferior à participação da população sergipana, na população brasileira. Neste sentido, tendo em vista que uma maior oferta de ensino superior tem relação com as maiores possibilidades de acelerar o desenvolvimento local, a criação de uma instituição estadual de ensino superior é uma proposta meritória.
Isto posto, apresentamos dados acerca da estruturação do ensino superior no Brasil, tendo como foco a matrícula em cursos de graduação presencial, evidenciando a proeminência do sistema privado, responsável, em 2008, por 75% da matrícula bem como a dinâmica de crescimento deste segmento, nos anos recentes. Chamamos a atenção, por outro lado, para os limites do crescimento deste segmento, especialmente nas regiões menos desenvolvidas, onde a oferta de novas vagas é condicionada pela renda das famílias e pela escolarização dos interessados no acesso ao ensino superior. A participação relativa do segmento privado é menor nas regiões norte e nordeste, não por deficiência do segmento em ofertar vagas, mas pela menor capacidade das famílias em custear o pagamento de mensalidades e pela escolarização de seus membros. Assim sendo, a expansão da oferta de ensino público, tanto da educação básica quanto do ensino superior, é crucial para o futuro das pessoas e das regiões com rendas inferiores à média nacional.
Nas regiões norte e nordeste, a matrícula nos segmentos públicos do ensino superior são maiores que a participação de suas economias no PIB do Brasil, mas inferiores às respectivas participações da população, na população brasileira, indicando uma possível melhora futura na distribuição interna de renda, mas não em um ritmo adequado ao alcance de uma equidade regional na distribuição da renda.
Evidenciamos os esforços de alguns municípios e estados em ampliar a participação do segmento público na oferta de vagas e as diferentes implicações. No caso dos municípios, o impacto nas finanças públicas é limitado, visto que as instituições municipais têm um caráter hibrido quanto ao financiamento, dependendo fortemente, no que diz respeito aos gastos correntes, do recebimento de mensalidades pagas pelos matriculados. Quanto aos estados, o financiamento público é importante e concorre com outras formas de gasto, inclusive com outros níveis de ensino, definidos constitucionalmente como obrigatórios.
Há situações limítrofes no segmento estadual do ensino superior. Em um caso, São Paulo e Paraná, por exemplo, os segmentos estaduais são preponderantes na oferta de vagas públicas e trata-se de estados ricos que podem custear os respectivos sistemas. Bahia e Ceará, por outro lado, têm sistemas estaduais importantes, mas são estados de renda média menor que a média nacional e têm maiores dificuldades em custear os respectivos sistemas estaduais. No outro extremo, temos estados relativamente ricos que possuem sistemas estaduais muito menores que o federal, em seus respectivos territórios, os exemplos notórios são Minas Gerais e Rio Grande do Sul. Estes estados têm aproveitado, em todos os ciclos de expansão do ensino superior federal, os respectivos pesos políticos para reivindicar a criação de novas instituições federais de ensino superior e a ampliação das existentes.
No nosso entender, esta é a melhor opção possível, especialmente para os estados mais pobres, que não deveriam assistir passivamente ao governo federal a atender demandas desses estados mais ricos, enquanto estados mais pobres não recebem recursos equivalentes.
Nos últimos anos, a Universidade Federal de Sergipe tem tido uma postura expansionista e tem contado com o apoio da bancada federal sergipana, de parcerias com outras entidades e com o apoio do governo estadual para viabilização de sua expansão. Talvez possamos tomar o Programa de Capacitação Docente (PQD) como um marco da parceria da UFS com o governo estadual. Este programa desenhado para acelerar a qualificação de professores da rede estadual e redes municipais, nos municípios do interior sergipano, atingiu os objetivos estabelecidos e sedimentou a idéia de interiorização da UFS que ocorreria mais recentemente com a construção de campi universitários em Itabaiana, Laranjeiras e, futuramente, em Lagarto. Da mesma forma, a implantação de pólos de Educação a Distância, através da Universidade Aberta do Brasil, e com a participação de municípios e do governo estadual, está permitindo a conquista de objetivos que, em outros estados, foi designado para instituições estaduais.
Concluindo, podemos dizer que não obstante haver mérito em uma proposta de criação de instituição estadual de ensino superior, a questão que se coloca é se ela seria prioritária. Questão mais delicada visto que, para os possíveis beneficiários, o mérito é evidente, para os que terão suas chances de atendimento de pleitos tão legítimos e meritórios quantos esse pleito, a relação de causa efeito de um atendimento e conseqüente recusa por incapacidade de o estado atender a todas as demandas não é tão evidente, gerando-se a conhecida situação que tudo parece ser importante e meritório.
Este é um tipo de decisão que tem um caráter eminentemente político, no sentido mais preciso do termo, e é confortante comprovar que, não obstante o aspecto aparentemente caótico do funcionamento da política, por vezes, se consegue os melhores resultados a que tecnocraticamente poderíamos aspirar.
A propósito, a construção já em curso do Campus de Lagarto se deveu a uma decisiva intervenção do governador Marcelo Déda. Não obstante ter sido listado no Plano de Expansão da Universidade Federal de Sergipe, apresentado em 2004, não havia detalhamento quanto aos cursos que seriam ofertados e, no REUNI, foram priorizados cursos para os campi de São Cristóvão e Aracaju. O acordo do governo estadual com o governo federal, através do Ministério da Educação, prevendo um rateio equitativo dos investimentos por ambos os níveis de governo e a disponibilização pelo Estado das instalações hospitalares e ambulatoriais regionais, foi decisivo para a implantação de um campus adicional ao projeto REUNI original.
Felizmente, não faltou ao governador a clarividência para distinguir mérito de prioridade. Este é um atributo exclusivo dos estadistas.
Reitor da UFS.