Seg, 26 de setembro de 2011, 12:37

A universidade e suas crises
A universidade e suas crises

Josué Modesto dos Passos Subrinho


25/05/2010


A Universidade Federal de Sergipe está completando 42 anos de instalação. É uma trajetória curta quando comparada com as primeiras universidades européias, com mais de oito séculos de existência, ou mesmo quando comparada com os primeiros estabelecimentos de ensino superior no Brasil. Já acumulamos, entretanto, uma considerável soma de experiências que levam à reflexão da natureza da instituição e de suas relações com a sociedade.



No ano em curso, a Universidade e a sociedade sergipana foram provocadas a discutir e reagir a uma nova forma de seleção de candidatos aos nossos cursos de graduação instituída através do Programa de Ações Afirmativas, aprovado pelo Conselho do Ensino Pesquisa e Extensão, em 2008, para entrar em vigor em 2009, com vistas ao vestibular do ano de 2010. Todo o processo de discussão, no interior da UFS, seguiu os trâmites regimentais e a aprovação do programa não envolveu muita paixão, não obstante a gravidade do assunto. Na sociedade, circulava a informação e se debatia acerca da implantação de variações de programas de ações afirmativas, em diversas universidades, e da tramitação, no Congresso Nacional, de alguns projetos de lei, inclusive um de iniciativa do governo, que propunham a adoção por todas as universidades públicas de ações afirmativas.

O primeiro vestibular da UFS, realizado sob a égide do Programa de Ações Afirmativas, que reserva uma quota de 50% das vagas aos egressos de escolas públicas e, dentro desta quota, uma fatia de 70% aos autodeclarados negros, pardos ou indígenas, despertou a paixão por um debate até então morno entre nós. Os descontentes apelaram para os mecanismos institucionais disponíveis para reverter a decisão da Universidade. Inicialmente, o Ministério Público Federal foi acionado. Não obtendo êxito, recorreram ao Judiciário. Neste, em sentenças liminares, aflorou uma tese interessante como fundamento para a decisão: a universidade não foi instituída para a correção das desigualdades sociais.

A primeira surpresa da tese é estabelecer um interdito às ações da universidade, visto que, desde a segunda metade do século XX, as universidades recebem demandas por novas ações a se sobrepor às tradicionais ensinar, pesquisar e difundir conhecimentos. São muitos os estudos a enumerar diversas novas ações que a sociedade e o estado demandam da universidade: propor novos modelos de desenvolvimento, acelerar o crescimento econômico, integrar jovens e grupos sociais discriminados à sociedade, rever o desequilíbrio e o papel dos gêneros, difundir a cultura empreendedora etc. Resumidamente, um dos aspectos da crise das universidades é a multiplicidade de demandas que sobrecarrega sua estrutura tradicional e, por vezes, provoca choques imensos entre os valores cultuados na academia e os valores e ritmos praticados na sociedade. Insistimos, a crise se origina da multiplicidade e desdobramentos de demandas da sociedade a exigir sempre mais da universidade.

Assim sendo, uma demanda para que a universidade se abstenha de fazer é, em certo sentido, inusitada, no momento histórico que vivemos. O pensamento Iluminista estabeleceu, entre os finais do século XVIII e início do século XIX, que a principal missão da universidade é ser a consciência crítica da nação. Este tem sido um valor axiomático ao qual se sobrepuseram as diversas missões criadas para a universidade, no transcorrer do tempo. É a partir dele que precisamos refletir acerca das ações das universidades públicas brasileiras, entre elas, a UFS.

Há alguma dificuldade em estimar o montante médio investido pelas diversas instâncias do poder público em um aluno da educação básica e do ensino superior. Uma aproximação razoável é de que um estudante da educação básica, na rede pública, recebe anualmente em torno de R$2.000,00 (dois mil reais) e um estudante do ensino superior público, em torno de R$15.000,00 (quinze mil reais). No Brasil, e em Sergipe, o quadro é semelhante, 80% dos estudantes da educação básica estão matriculados em escolas públicas, no ensino superior, o quadro se inverte, ou seja, quase 80% dos estudantes estão matriculados em instituições privadas. As escassas vagas das universidades públicas são ocupadas majoritariamente por egressos das escolas privadas, reforçando e remetendo ao futuro a iníqua distribuição de renda vigente.

Diante disto, a pergunta é: pode a consciência crítica nacional dormir tranquilamente, interditando ações da universidade, visando a alterar tal quadro de flagrante injustiça social?


Currículo
Reitor da UFS."


Atualizado em: Seg, 26 de setembro de 2011, 12:38
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