Qua, 15 de junho de 2011, 05:02

A gestão dos resíduos sólidos em Sergipe: desafios e possibilidades do novo contexto regulatório
A gestão dos resíduos sólidos em Sergipe: desafios e possibilidades do novo contexto regulatório

Florence Heber, Lício Valério L. Vieira e Elvis Lima M. da Silva


A aprovação da Lei nº 12.305/10, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) deu-se num contexto considerado mais do que urgente. Segundo dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), em 2007, da totalidade de resíduos sólidos gerados no Brasil, somente 38,6% eram dispostos de forma considerada adequada, enquanto 68,4% eram depositados em sua grande maioria nos lixões a céu aberto. Em Sergipe, essa realidade é ainda mais grave, pois 100% dos resíduos sólidos coletados não possuem a disposição final ambientalmente adequada.

Com a vigência da nova lei, todos os estados e municípios brasileiros passam a dispor de um marco regulatório abrangente para a gestão dos resíduos sólidos e devem, a partir deste marco, organizar-se para colocar em prática todas as suas orientações em um prazo de 4 anos. Esta organização inclui a elaboração de Estudos de Regionalização; a elaboração de Planos Estaduais de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos; o fortalecimento e implementação de consórcios públicos; a elaboração de Planos Intermunicipais e/ou Municipais de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos e o apoio/estímulo à organização e ao desenvolvimento de cooperativas e associações atuantes no setor de reciclagem de resíduos sólidos.

Considerando as dificuldades técnicas e financeiras que muitos municípios brasileiros têm para lidar com os resíduos sólidos, a PNRS estimula a formação de consórcios públicos municipais ou interfederativos na perspectiva de garantir maior sustentabilidade técnica e financeira aos serviços. Neste sentido, os municípios que adotarem o modelo consorciado para gestão de resíduos passarão a contar com linhas de financiamento específicas do Governo Federal. Segundo a PNRS é de suma importância a articulação entre os municípios com objetivo de construírem políticas públicas de resíduos sólidos integradas e complementares à Política Nacional. Essa articulação deve ter como objetivo a busca por alternativas institucionais que otimizem recursos que se traduzam em oportunidades de negócios com geração de emprego e renda, e receitas para o município.

Outro destaque da nova regulação é a intenção de incluir formalmente os catadores de resíduos na cadeia produtiva com o objetivo de geração de emprego e renda e inclusão social desta parcela da população. O Poder Público pode, inclusive, contratar cooperativas ou associações de catadores de materiais recicláveis com dispensa de licitação Na verdade, é o reconhecimento institucional de uma categoria profissional há muito estigmatizada e colocada praticamente à margem da sociedade, mas que tem paulatinamente se organizado em cooperativas e associações pelo Brasil afora e que tem um papel central na reciclagem de resíduos. O filme “Lixo Extraordinário” que concorreu ao Oscar/2011 retrata bem esta realidade.

Como a PNRS (incluindo a Lei 12.305/10 e o seu Decreto Regulamentador 7.215/10) tem como objetivo central estimular a não-geração, redução, reutilização, reciclagem e tratamento de resíduos sólidos, um dos principais conceitos que integram este marco regulatório é o de Responsabilidade Compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos. E o que significa isso? Sabemos que todo produto tem um ciclo de vida que envolve o seu próprio desenvolvimento, o seu consumo e a sua disposição final. Então, na lógica da regulação visando a responsabilidade compartilhada, fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes, consumidores e os municípios são responsáveis pelos resíduos que geram e devem acondicioná-los e separá-los adequadamente. Nesta direção, os membros da cadeia produtiva dos resíduos devem, ainda, investir na fabricação de produtos que possam vir a ser reciclados ou destinados de forma adequada.

A Logística Reversa também integra esta concepção de responsabilidade dos geradores de resíduos sólidos, prevendo o retorno pós-venda e pós-consumo de resíduos aos seus produtores para que sejam reciclados ou reaproveitados. A logística reversa é direcionada aos produtores de agrotóxicos, suas embalagens e demais produtos cujas embalagens sejam resíduos perigosos; pilhas e baterias; óleos lubrificantes, seus resíduos e embalagens; pneus; lâmpadas contendo mercúrio e; eletroeletrônicos, podendo ainda ser estendido para os produtos comercializados em embalagens de: plástico, metal, vidro. Desse modo, a logística reversa atribui formalmente ao produtor (empresas em atividades descritas acima) a responsabilidade pela geração e reciclagem e/ou destinação final dos resíduos que produz e prevê que estas ações deverão requisitar postos de coleta específicos e parcerias com associações de catadores, mas provavelmente a logística reversa criará outras formas de associação e mercado e negócios totalmente novos.

Em médio prazo, a expectativa é de generalizar, onde seja possível, a coleta seletiva em todos os municípios brasileiros com uma ampla participação das associações de catadores e de todos os geradores de resíduos além da eliminação definitiva, até 2014, dos lixões a céu aberto, tão presentes na paisagem dos municípios brasileiros. A meta é a universalização dos serviços da gestão de resíduos sólidos urbanos em todos os municípios.

O Estado de Sergipe, através da Secretaria de Meio Ambiente e Recursos Hídricos, destaca-se por ter sido pioneiro no Brasil nas ações visando a regionalização e constituição de consórcios intermunicipais através do Plano Estadual de Regionalização da Gestão dos Resíduos Sólidos de Sergipe. Em março de 2011 foi inaugurado o primeiro consórcio intermunicipal para gestão de resíduos no interior do Estado, o Consórcio Intermunicipal de Saneamento Básico do Agreste Central.

No entanto, considerando a complexidade do planejamento, ações e articulações necessárias à implantação do novo marco regulatório, é previsível que todos os Estados brasileiros passem a dispor de um papel fundamental no planejamento e instrumentalização técnica e institucional dos gestores municipais, já que os Planos de Gestão integrados previstos na PNRS devem ter horizonte de 20 anos, conter diagnósticos, proposição de cenários, metas para redução de rejeitos, programas, projetos, ações e estes são requisitos para acesso a recursos da União.

Além deste papel, os Estados terão, ainda, provavelmente, que desempenhar a fiscalização das ações a serem executadas pelos municípios ou consórcios intermunicipais no âmbito do seu território.

Cabe então a pergunta: com tantas atribuições e responsabilidades e considerando a complexidade e o desafio de exercer um papel prioritário na implementação de ações direcionadas à sustentabilidade ambiental, saúde pública, inclusão social, estímulo a geração de renda e surgimento de novos mercados previstos no PNRS, não seria o momento ideal para refletir sobre a criação de uma instância específica para a regulação de serviços públicos, especialmente serviços de coleta e destinação final de resíduos sólidos no Estado de Sergipe?

O debate está lançado...


Currículo
Florence Heber - professora adjunta do Departamento de Administração da UFS;
Lício Valério L. Vieira – superintendente da SEMARH – professor do IFS;
Elvis Lima M. da Silva – tecnólogo em Saneamento Ambiental e Pesquisador do ITP e aluno do curso de Administração da UFS."


Atualizado em: Qua, 15 de junho de 2011, 05:06
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