Saber Ciência / Marlécio Maknamara
20/07/2009
Tem pamonha, canjica e milho verde, mas você deve chupar algo que é de uva. Tem quadrilha, padre e puxador, mas há também cavaleiros do forró. Ainda tem vestido de chita, trancinha e bota, mas a menina pode ir de saia rodada e calcinha preta, de preferência. Vem aí o São João 2009! Ou melhor, ele já chegou, pois em todo o estado já começou a pipocar a festa “tipicamente nordestina”! Seguindo a tendência dos últimos anos, tudo indica que sua trilha sonora principal será o forró eletrônico. Um excelente momento, portanto, para discutir as possíveis conexões desse estilo de forró com o campo educacional. Mas o que o forró eletrônico teria a ver com a educação?
Enquanto bandas de forró eletrônico patrocinam times de futebol em estados nordestinos, escolas de dança e academias tiram proveito das criações de suas músicas. Tais músicas já fazem sucesso não apenas em todo o Brasil, mas também no exterior, sendo que a movimentação em torno delas gera milhares de postos de trabalho. Em contrapartida, intérpretes desse estilo participam de espetáculos cênicos, de ensaios de moda, de campanhas publicitárias, arrancam elogios de “autoridades” de outros gêneros musicais e são ídolos de outros ídolos nacionais. Além disso, se o forró eletrônico transita entre todos esses espaços sociais, certamente chega também às nossas escolas. Essa afirmação é possível não apenas porque a Lei n. 11.769/2008 faz da música um componente curricular obrigatório na educação básica brasileira e oficialmente abre as portas para o ensino dos mais diferentes estilos musicais. O forró eletrônico está presente nas escolas também porque, mesmo antes de qualquer regulamentação a seu favor, a música invade o cotidiano escolar em diferentes momentos e por meio de estratégias diversificadas.
No sentido dessa invasão da educação escolar pelo forró eletrônico, diferentes pesquisas mostram que a escola tem se tornado palco do que se vê e ouve fora dela; que alunos e alunas levam suas músicas às salas de aula; que freqüentemente professoras utilizam em suas práticas pedagógicas as produções musicais já consagradas fora da escola; e que a linguagem musical tem servido de fonte inesgotável de atividades e recursos para aquela instituição. Assim, não é difícil constatar a presença do forró eletrônico na vida estudantil de brasileiros e brasileiras. Acessando o site do Youtube, por exemplo, é possível encontrar vídeos retratando o “forró na escola”. Neles, há meninas fazendo apresentação de um grupo de forró denominado “As taradinhas” (cujas músicas e coreografia, de autoria delas mesmas, são apresentadas em uma festa de despedida na escola); meninos adaptam ao forró uma música de pop-rock; jovens se amontoam no pátio de uma escola pública paulistana para ver uma apresentação ao ritmo do forró eletrônico e, em meio a danças e gritos frenéticos, cantam em uníssono: “na sua boca eu viro fruta/chupa que é de uva...”.
Todas as evidências supracitadas já seriam suficientes para que os sujeitos da educação (docentes, discentes, pais e mães, diretores e coordenadores pedagógicos, etc.) não negligenciassem os efeitos do forró eletrônico sobre a educação escolar, sobretudo quando é sabido que o forró atualmente desponta como música preferida por um quarto da juventude brasileira, conforme estudo divulgado pela Folha de São Paulo em julho do ano passado. Em contrapartida, para evitar tanto um denuncismo estéril sobre sua famigerada “qualidade duvidosa” quanto uma celebração ingênua acerca dos seus feitos, vale propor um debate mais atento àquilo que efetivamente se ensina nas músicas de forró eletrônico, antes mesmo delas adentrarem as escolas. Mas tal proposição será tema de uma próxima conversa. Enquanto ela não vem, você aceita uma dança?
Marlécio Maknamara é professor do Departamento de Biologia da UFS, Mestre em Educação (Educação Popular, Comunicação e Cultura)/UFPB e Doutorando em Educação (Conhecimento e Inclusão Social)/UFMG.
Saber Ciência é uma coluna semanal de divulgação científica publicada no CINFORM. É uma atividade da Agência UFS de Divulgação Científica, sob coordenação do Prof. Dr. Josenildo Luiz Guerra, e com apoio da Fundação de Apoio à Pesquisa e à Inovação Tecnológica do Estado de Sergipe - Fapitec.
Currículo
Marlécio Maknamara é professor do Departamento de Biologia da UFS, Mestre em Educação (Educação Popular, Comunicação e Cultura)/UFPB e Doutorando em Educação (Conhecimento e Inclusão Social)/UFMG.