Qua, 16 de setembro de 2015, 12:07

FAPITEC/SE: cargos, encargos e rumos da ciência em Sergipe
FAPITEC/SE: cargos, encargos e rumos da ciência em Sergipe

Antônio Carlos dos Santos

Sêneca, o filósofo romano do século IV antes de Cristo, é conhecido, sobretudo, por suas frases curtas e precisas, como esta: “Não existe vento favorável para o marinheiro que não sabe aonde ir”. Com esta frase, defendia a ideia segundo a qual a vida não depende do destino, da sorte ou da ocasião, mas de determinação do sujeito que dita normas de conduta e que planeja o futuro. É verdade que, como bom romano, conhecia a importância do acaso, mas estava certo que ele não ditava, sozinho, o futuro.

Ora, o objetivo deste texto é analisar a situação da FAPITEC-SE no contexto de uma crise política e econômica do Estado de Sergipe e as perspectivas da ciência nas terras de Sergipe Del Rey. Para que possamos alcançar tal meta, dividiremos nosso texto em duas partes: na primeira, abordaremos um pouco do histórico da nossa agência de fomento e, na segunda, os seus maiores desafios. Ao fim e ao cabo, esperamos sensibilizar nossos governantes, políticos, parceiros do setor produtivo e a sociedade em geral, sobre a ciência em nosso estado. Ela merece cuidado e atenção especial.

A antiga Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Sergipe - FAP-SE nasceu após a Constituição de 1988 obrigar os Estados a terem financiamentos oriundos de seus respectivos orçamentos. Como em quase todo o país, demorou mais de 10 anos para ser implementada. Instituída pela Lei nº 4.197 de 29 de dezembro de 1999, apenas no ano de 2000 ela começou a ganhar corpo.

Segundo nossa Constituição Estadual, conforme estabelece o § 2º do Art. 235, o governo é obrigado a investir no mínimo, 0,5% (meio por cento) da arrecadação tributária do Estado, dela deduzidas as transferências feitas aos Municípios, bem como os créditos adicionais que lhe sejam destinados para o fomento da pesquisa científica e tecnológica.

Para isso, foi instituído por meio da Lei nº 5.773, o Fundo Estadual para o Desenvolvimento Científico e Tecnológico - FUNTEC. A FAP-SE, à época, geria autonomamente esse Fundo. Mas isso durou pouco. Em 28 de dezembro 2004, através da Lei nº 5.511, o ex-governador João Alves Filho extinguiu-a, e designou as suas funções ao Instituto Tecnológico e de Pesquisas do Estado de Sergipe – ITPS, vinculado à Secretaria de Estado da Indústria, do Comércio e da Ciência e Tecnologia - SEICTEC, retirando o que ela havia de mais precioso: a sua autonomia financeira. O resultado dessa manobra política e financeira foi a perda de sua autonomia na gerência dos recursos para a SEICTEC.

Em 12 de dezembro de 2005, por meio da Lei º 5.771, a FAP-SE foi recriada, denominada de Fundação de Apoio à Pesquisa e à Inovação Tecnológica do Estado de Sergipe - FAPITEC/SE. Hoje, após mais de 15 anos da fundada, o pagamento de uma simples bolsa de pesquisa a um aluno percorre um caminho tortuoso, cheio de obstáculo e incertezas. O que poderia ser uma data digna de comemoração, a debutante não tem nenhuma garantia que terá dinheiro no final do mês para pagar seus compromissos, que dirá uma festa. Até onde isso vai nos levar? Até quando o governo e políticos estaduais vão entender que ciência e tecnologia são importantes para o desenvolvimento econômico e social do Estado?

Passados mais de 10 anos dessa condição, nenhum governador ousou mudar essa lógica tosca em relação à ciência e, a cada novo mandato de governador, o medo paira sob os pesquisadores, surgindo dúvidas de toda ordem: a FAPITEC/SE vai ter continuidade? Tem recursos financeiros com dotação orçamentária? A sua direção estará sob o controle de um técnico, que conhece ciência e tecnologia, ou padrinho político (dsconhecedor dos problemas que envolvem ciência, tecnologia e inovação)? Alunos e pesquisadores que atuam em Sergipe vão ter garantia de continuidade e aplicação dos recursos em suas pesquisas? São perguntas ao léo, que gostaríamos de obter alguma resposta. O fato é que a debutante, que poderia sinalizar a passagem da infância à maturidade, mais do que nunca, luta por fazer valer o que está em nossa Constituição: ser a legítima agência de fomento em ciência, tecnologia e inovação do Estado de Sergipe com tudo que isso implica. Para isso, os desafios são enormes.

O primeiro grande desafio, a nosso ver, é dar autonomia institucional e financeira à FAPITEC/SE, mudando o marco legal que transformou a Fundação vinculada à Secretaria de Desenvolvimento Econômico e da Ciência e Tecnologia – SEDETEC, para que a FAPITEC/SE volte a exercer efetivamente seu papel de operadora do Sistema Estadual de Ciência e Tecnologia, sendo a gestora do FUNTEC. Cabe à SEDETEC juntamente com o Conselho Estadual de Ciência e Tecnologia (CONCIT) cuidar da política estadual de Ciência e Tecnologia, ou seja, traçar as diretrizes macro das áreas do conhecimento de maior carência, para que a FAPITEC/SE possa fomentar e alavancar o desenvolvimento econômico, social e ambiental do nosso Estado.

Atualmente, entre os meandros do que a Fundação precisa e o que a Secretaria faz, há um fosso, cada vez maior, onde se perdem recursos, tempo, objetivos, dentre outros, que só fazem retardar o desenvolvimento de Sergipe. Governo, políticos, empresários do setor produtivo, e comunidade em geral precisam entender que a ciência tem um caráter universal e público, e que a agência estadual tem como responsabilidade pensar a política de fomento à ciência por meio de concessão de bolsas e auxílios (embora nem sempre suficientes), responsável pelo seu desenvolvimento na esfera estadual.

Em segundo lugar, com a expansão das Universidades públicas e a sua interiorização, de modo particular, em Sergipe, o Estado recebeu um enorme contingente de Doutores que atuam em cidades longe da capital, mas que estão ávidos para transformar seus conhecimentos e expertise em produtos, resultando em desenvolvimento local. Isto significa dizer que o desenvolvimento do interior sergipano passa pela capacidade do Estado de atrair e fixar jovens Doutores que atuem no que muitos chamam de “tríplice hélice”: universidade, empresa e governo, visando ampliar a produção científica da universidade para o setor produtivo com o fito de desenvolver as regiões mais carentes e que contam com a presença e atuação das Universidades ou Campus Avançado. Vemos aí o necessário investimento em Ciência, tecnologia e inovação e as necessidades regionais do Estado de Sergipe.

O último desafio, finalmente, e não menos importante, é autonomia política da FAPITEC/SE. Ou seja, os órgãos vinculados à ciência e tecnologia não podem ser ocupados por pessoas que não têm competência para geri-los. Um perigo ronda essas instituições, especialmente em momentos de fragilidade política e econômica: muitos buscam o cargo, não o encargo. Estão à procura de salário, não de trabalho. Por meio de favoritismo, clientela ou privilégios, fazem uso dos bens público para fins privado, sangrando a res publica e corrompendo o bem comum. A comunidade científica sergipana não pode calar-se diante disso e deve ficar atenta a desafios prementes como este. Trata-se de uma eterna vigilância.

Para onde queremos ir com a ciência em Sergipe? Por quais caminhos trilhar? Que atitude tomar diante do tamanho dos seus desafios por essas terras? Até quando o gasto com a ciência no Estado vai ser interpretado como investimento no desenvolvimento local? Quando teremos uma agência de fomento à ciência, tecnologia e inovação autônoma, livre das amarras políticas e financeiras? Utopia? Talvez. Mesmo distante, jamais devemos perder esses desafios de vista. Só assim, o que seria aparentemente distante e impossível vai se aproximando de nós, tornando-se real e concreto.


Atualizado em: Qui, 18 de agosto de 2016, 14:59
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