Qui, 14 de maio de 2015, 07:50

Pode conversar na sala?
Pode conversar na sala?

Luiz Eduardo Oliveira


Quase sempre, o professor universitário se encontra refém de situações com as quais não sabe nem tem suporte legal para lidar em sala de aula. É o caso de alunos conversarem enquanto ele fala. Na minha experiência como professor da UFS há mais de 20 anos, afirmo que isso ocorre com frequência tanto na graduação quanto na pós-graduação. Por que os professores têm que conviver com esse tipo de problema passivamente, fazendo as vezes de professor disciplinador ou simplesmente desistindo de fazer um trabalho mais sério? Arrisco um palpite.


Antigamente, o professor dispunha de vários dispositivos para punir tal “infração”: expulsar o aluno da sala, tirar pontos, impor um trabalho individual, punir a turma com trabalhos valendo nota etc. Agora é diferente. Não se pode sequer pedir com gentileza que o aluno se retire da sala, caso ele esteja atrapalhando não só a exposição do professor como também a compreensão dos alunos, isso quando ele(a) ou ele(a)s não conversam durante as intervenções dos próprios colegas. O professor, nesse caso, vira refém. Ele não dispõe de nenhuma lei ou resolução que lhe dê suporte, salvo quando é vítima de agressões físicas – já houve casos na UFS de professores que levaram socos de alunos – ou verbais, oralmente ou por escrito, quando poderá acionar a Ouvidoria, em âmbito institucional, ou a justiça comum, que acaba sendo a melhor saída para o professor – ou para o aluno, a depender do caso.


O ato de conversar, em si mesmo, não é maléfico nem malévolo. Isso depende apenas das circunstâncias. Não defendo que, numa sala de aula, o professor deva protagonizar todas as atividades didático-pedagógicas, pois, a par e de acordo com as novas orientações legais e científicas relacionadas à docência e à formação docente, acredito mesmo que o professor seja um mediador e facilitador no processo de aquisição de conhecimento, e que a sua postura deva ser de um professor-pesquisador, tal como propunha Montessori, Dewey e tantos outros pensadores da educação, pelo menos do século XIX para cá. Mas conversar numa hora ou ocasião inconveniente é uma questão de educação social e/ou doméstica.


Claro que, numa mesa de bar, entre amigos, pode-se falar à vontade, um atropelando o outro, como nos programas de debate esportivo na televisão, nos quais os debatedores falam ao mesmo tempo e o telespectador acaba não entendendo nada. Por uma questão de consideração e respeito, sempre devemos estar atentos quando alguém conversa conosco. A alternância das falas é a característica principal de um diálogo. Numa sala de aula, essa mesma lógica deve ser obedecida. Mesmo que o professor não se coloque como um preceptor ou orador, pois, se consideramos a relação professor-aluno como sendo horizontal, como manda a lei, é preciso que, como colegas e até, se for o caso, como amigos, o respeito seja mantido. Que o direito de falar e ouvir sejam respeitados.


Posto isto, qual é o motivo ou a razão pela qual alguns alunos insistem em conversar durante a fala do professor ou dos colegas? Seria uma busca incessante de conhecimento, que não espera nem a explicação do professor sem antes consultar o colega, o celular, o caderno, o livro, o notebook? Seria simplesmente uma antipatia com o professor, e, nesse caso, os professores têm obrigação de ser simpáticos, tendo que atender aos variados padrões de simpatia dos alunos? Seria algo tão natural que, na maioria das vezes, eles fazem “sem querer”?


Não acredito em nenhuma dessas alternativas. Há tempos o perfil do estudante de graduação mudou. Seus interesses são mais pragmáticos. Como leciono literatura, uma disciplina “inútil” por excelência, no sentido positivista da produção de conhecimento, daí o seu caráter “humanístico”, por assim dizer, talvez não tenha as habilidades necessárias para tornar a minha disciplina utilmente atrativa para os alunos. Em minha opinião, o aluno que conversa durante a aula tem uma atitude covarde, pois sabe que está coberto por todos os regulamentos e que o professor não poderá fazer nada a respeito. Muito pelo contrário, poderá acariciar ainda mais o seu ego chamando a sua atenção a todo momento durante a aula, ou mesmo fazer as vezes de babá, cuidando de garotinho(a)s mal comportados. É preciso que sejam repensadas as relações humanas e interpessoais na Universidade, sobretudo quando estamos em sala de aula.



Luiz Eduardo Oliveira é professor Associado IV do Departamento de Letras Estrangeiras e dos programas de pós-graduação em Letras e Educação da UFS.



Atualizado em: Qui, 14 de maio de 2015, 07:52