Sex, 19 de maio de 2023, 11:23

Deputada Ana Lúcia Vieira de Menezes, a primeira professora da Educação Básica a receber o título de Honoris Causa da UFS
Silvana Bretas é diretora do Centro de Educação e Ciências Humanas da UFS

Boa noite a todas e todos!

Em nome da Deputada Profa. Ana Lúcia Vieira Menezes quero saudar sua família, o esposo Dr. José Santos Menezes, os filhos Monica Carla Vieira Menezes, Mário Jorge Menezes Vieira Sobrinho, Ana Carolina Vieira Menezes Nunes e seus netos Ana Luíza Vieira Menezes Góis e João Vinicius Vieira Menezes Góis;

Em nome do Prof. Dr. Valter Joviniano Santana Filho, nosso Magnífico Reitor, saúdo a comunidade acadêmica da UFS e de todas as Instituições de Ensino Superior aqui presentes;

Em nome do representante da Direção Estadual do Partido dos Trabalhadores – PT, Sr. Silvio Santos, saúdo sua aguerrida militância e toda classe trabalhadora;

Em nome do Prof. Roberto Silva, Presidente do Sintese, saúdo todas/os as professoras/es das redes públicas e privada do Estado;

Em nome do Prof. Obanse Severo D’Ancelino e Porto, saúdo a todas as professoras/es da rede municipal de Aracaju;

Em nome das Vereadoras Profa. Angela Mello e Profa. Sonia Meire, saúdo a todas as autoridades presentes e a todas/os representantes dos movimentos sociais aqui presentes.

Em nome dos egrégios Conselhos Superiores cumprimento a todas as Pró-Reitoras e os Pró-Reitores, as/os Diretoras/es de Centro e Campi, docentes, discentes, TAE, a Presidente da Adufs, o Presidente do Sintufs e a Presidente do DCE.

Eu não posso disfarçar o fio de aço que me corta os nervos desde o momento em que recebi a honrosa tarefa de representar os Conselhos Superiores da UFS para prestar essa homenagem à nossa agraciada, Deputada Profa. Ana Lúcia Vieira Menezes! Não vou disfarçar o quanto é estonteante escrever sobre uma mulher política que encontra consenso sobre sua liderança e importância entre aliados e opositores. Uma mulher cuja profissão docente se funde com a história do sindicato das/os trabalhadoras/es docentes de Sergipe. Uma militante de esquerda que não se apartou das lutas da rua junto aos movimentos sociais e sindicais, em nenhuma das fases de sua vida, seja como recém formada em Pedagogia na UFS, seja como secretária de órgãos da gestão pública, seja como presidente do Sintese, seja como intelectual comprometida com a educação emancipadora ou seja como Deputada estadual em 4 mandatos. Enfim, caras/os colegas, só estou tentando conquistar a sua cumplicidade e complacência com o meu estado.

As horas passando, o dia chegando e minha agonia só aumentando, pois quanto mais procurava me munir de informações para fazer jus à sua trajetória, mais percebia o que eu já sabia: estou diante de uma mulher que escapa à lógica das sínteses, dos elogios óbvios e do lugar comum de destaque à sua intensa trajetória! Tudo isso é muito justo, mas ínfimo diante da gigante que é a Professora Ana Lúcia!

Seu percurso passa pelo campo da docência, da educação, da política sindical, partidária e da cultura. Passaria um tempo considerável para apenas dar algumas pinceladas em cada campo. Diante da tarefa infinda, há algo que gostaria de colocar em evidência: é a primeira professora da Educação Básica Pública a receber o Título de Doutora Honóris Causa pela UFS!


Esse fato é por si só uma provocação diante da narrativa generalizada pelas mídias, pelos órgãos públicos da educação e, até mesmo, por parte da população de que a escola pública não funciona, que seu o corpo docente é mal formado e desinteressado e que estudantes não têm disciplina e não gostam de estudar. Por esta razão, o ato de outorga deste título carrega a dimensão vibrante e inequívoca de que professoras/es são intelectuais com compromisso com a formação dos estudantes e que a escola pública é espaço de socialização, da produção de conhecimentos, das artes, da cultura, da subjetivação e objetivação da constituição do ser humano.

A Universidade Federal de Sergipe, ao aprovar a propositura do Prof. Dr. Romero Venâncio Júnior (DFL), e do Centro de Educação e Ciências Humanas – CECH, não só respalda a assertiva como também se indaga: o que temos a aprender com a professora da educação básica? Que força é essa que levanta uma categoria de profissionais, cria um sindicato combativo, ganha as ruas, ganha corações e mentes, e não se aparta em nenhum momento daquilo que definiu como seu destino que é a luta pela emancipação da classe trabalhadora, por uma educação de base democrática e por uma sociedade justa?

Para quem está de cabelos brancos como eu, já assistimos, mais vezes do que gostaríamos, a políticos surgirem da base de sua categoria ou movimento social, ganharem o parlamento e se definharem ideologicamente ao reduzir o embate político à conquista de eleição. Definitivamente, não foi o caso de Ana Lúcia! Eu me arrisco a inferir, sem medo de errar, que a fonte de sua força e lealdade já estava presente na jovem pedagoga que poderia ter seguido tantas outras carreiras tidas como mais prestigiadas, dada a sua origem social, mas escolheu ser professora do magistério da Educação Básica e, como se não bastasse, vai beber na fonte de seu sempre mestre Paulo Freire e aprende que uma educadora não se restringe a pensar em ideias, mas na existência e, por isto, não separa o seu fazer de seu pensar.

Portanto, nobre comunidade acadêmica e demais presentes, a primeira lição que a Profa. Ana Lúcia nos dá é a de que a docência é o próprio testemunho de vida que nos exige a coragem de assumir a luta dos professores nas salas de aula, nas escolas, nas estruturas do sistema escolar e na sociedade em defesa de seus direitos e dignidade. Para citar Paulo Freire, a luta “deve ser entendida como um momento importante [da] prática docente, enquanto prática ética. Não é algo que vem de fora da atividade docente, mas algo que dela faz parte”.

E aqueles/as que por todos os meios de poder tentam destruir essa carreira oferecendo reajustes indignos, negando concurso público, tratando a categoria com o braço forte do estado, introduzindo e apoiando políticas que abrem espaços às caças-níqueis do dinheiro público: fundações empresariais educacionais, tenham medo! Em nossas fileiras está a Profa. Ana Lúcia Vieira de Menezes que em 1992, já presidente do Sintese, foi capaz de fazer uma greve de fome para exigir que o então governador João Alves aprovasse um novo Estatuto do Magistério Público Estadual e reajustasse o salário vexatório que até então era pago aos professores. Nesse caso, a filha do Sr. Claudomir e Dona Ivone Vieira e, também, filha do sr. Osman: paizinho e de Dona Carolina Menezes: mãezinha, colocou a própria vida em risco pela causa da educação.

Para quem, ainda adolescente, acompanhava sua mãe nas visitas ao único irmão, o renomado poeta Mário Jorge Vieira, preso pelo AI-5/68 no 28 BC, não nos causa surpresa a sua disposição para o enfrentamento.

Sua amiga, a Professora Ubaldina, me contou que desconhece alguém que tenha tamanha entrega, disposição e amor pelo magistério. Como Deputada em seus 4 mandatos atendeu a todas as categorias, mas o magistério sempre foi seu chão e fonte de energia.

No fio condutor de sua trajetória e na minha busca de trazer seus ensinamentos, eu destacaria mais um fato também presente na jovem pedagoga à destacada política do Parlamento Sergipano: seu compromisso intelectual com a condução da luta, uma preocupação de formulação teórica para que tanto as lideranças quanto a base se fortalecessem intelectual e moralmente nas razões pelas quais lutavam.

Recorro ao meu colega Prof. Afonso Nascimento (2021) quando informa de sua participação “entre os anos de 1982 a 1996, na composição de um grupo de pressão composto de intelectuais e militantes políticos de esquerda [como] Alexandrina Luz, Ruy Belém de Araujo, Diomedes Santos da Silva, Gildete Cardoso, Sônia Maria Santos, entre outros”1. Do mesmo modo, em entrevista cedida à pesquisadora da História da Educação, Elze Plácido2, sobre a origem da organização sindical dos trabalhadores da educação de Sergipe, Ana Lúcia afirma que nas vésperas daquilo que seria a construção de um sindicato classista, estava a necessidade de estudo sistemático para uma oposição séria e consequente para disputa da liderança da categoria. Assim, fez levantamento bibliográfico, grupo de estudos aos sábados e através de Professores como o saudoso José Paulino e de sua companheira Profa. Valburga Arns, estabelece contato com intelectuais renomados como Gaudêncio Frigotto, Corintha e Vanderlei Geraldi, Sírio Possenti e Luís Cagliari, só para citar alguns. Este tipo de organização sindical funde a luta pelos direitos da categoria vinculada a uma concepção de educação, de escola e de formação e, ao mesmo tempo, inaugura um novo tipo de sindicalismo dos trabalhadores da educação, pois como a própria Ana Lúcia informa à pesquisadora:

Então a gente começa a construir um outro modelo de gestão de movimento, E a discutir, a refletir, que a gente repetia muito as práticas do movimento operário, mas que o movimento do servidor público não podia ser uma reprodução do movimento operário, porque o poder de força de um era diferente do outro. Um era gerando a riqueza material o outro era gerando a riqueza do pensamento e do espírito3.

Parabenizo a pesquisadora da história da educação por nos trazer à luz o germe da origem do grande Sintese e que nos sirva de lição na construção da nossa luta na educação superior.

Como Parlamentar de 4 mandatos os exemplos de ensinamentos preencheriam folhas e folhas, então volto ao meu eixo de tentar captar o sentido, o pensar e o fazer: ela inova a forma de ser parlamentar na medida em que abre as portas da casa do povo, como ela mesma diz: “ao abrir as portas da casa do povo, estendemos à sociedade um convite que não se esgota com fim de nossos mandatos: manter ativa e sempre visível a presença popular na Alese”4. Além da assiduidade nas seções parlamentares cria canais de acesso à presença da sociedade civil organizada, através de audiências públicas com temas fincados na realidade da população sergipana como trabalho infantil, estatuto da juventude, cultura popular, violência contra mulher, direito das pessoas com deficiência, sistema estadual de cultura, liberdade religiosa e estado laico justo e igual. Traz a sua experiência de intelectualização da categoria para dentro da Assembleia e propõe seminários com os mesmos temas com a presença de especialistas de toda parte do país, permitindo assim que o povo se informe e conheça melhor seus direitos.

A proposição de medalhas e comendas não são meras ilustrações a membros de uma elite sergipana, mas o reconhecimento daqueles e daquelas que lutaram e lutam pelos direitos humanos. Só para citar algumas: Medalha de Direitos Humanos, Medalha Manoel Bonfim e Medalha Quintina Diniz e também as comendas Abdias Nascimento, Beatriz Nascimento entre outras.

Na função estrita de parlamentar, Profa. Ana Lúcia foi autora de leis, entre elas a que institui a Quinzena do teatro e do circo; Institui a História e Cultura Afro-Brasileira e Africana nas escolas; Reconhecimento de Paulo Freire como Patrono da Educação Sergipana; Reconhece o Tototó, o Barco de Fogo, as Cabacinhas de Japaratuba e o amendoim cozido como patrimônios culturais do Estado de Sergipe. E só para concluir a lista enorme, hoje, 12 de maio, é aniversário de 11 anos da entrada em vigor da Lei 7.139/2011 que institui o dia da/o trabalhadora/or doméstica/o. Parabéns às/aos nossas/os companheiras/os!

Em seus 4 mandatos instituiu o Calçadão Popular com o Dia do Folclore, Dia da Mulher, dia Educação Inclusiva, Da consciência negra; pois para Ana Lúcia “das ruas viemos, nas ruas nos mantivemos e na rua estaremos”5

Para encerrar e presentear a nossa querida professora, vamos citar outro gigante, nascido na mesma praça, no mesmo jardim do bairro São José e, coincidentemente, também filho de dona Ivone e Seu Claudomir. No livro CUIDADO! Silêncios Soltos! Diz o poeta Mário Jorge Vieira:

“A revolução não é só política, abrange para ser autêntica todos os setores da realidade humana. É preciso transformar com o gesto e explodir com o grito. E o grito (a palavra) no mundo contemporâneo tem que ser mais alto do que a mentira imposta, jogada, consumida cotidianamente.”

Parabéns Profa. Doutora Ana Lúcia Vieira Meneses, seja bem vinda à nossa casa!

Silvana Bretas é diretora do Centro de Educação e Ciências Humanas da UFS

2 Doutorando do PPGED/UFS.

3 Trecho da entrevista concedida à doutoranda Elze Plácido (2023)

4 Retirado das revistas “Ana Lúcia, 4 mandatos populares – 2003/2018. Impresso

5 Idem


Atualizado em: Sex, 19 de maio de 2023, 11:45
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